Desde a primeira cena que abre o filme com Cailee Spaeny sentada olhando para o céu, já dá pra perceber que existe algo diferente nesse filme. Tal cena, apesar de ser basicamente apenas uma abertura, é carregada de delicadeza e sensibilidade, seja pela textura do ambiente, ou por como a câmera caminhe sobre essa tela e pousa sobre o rosto de Cailee Spaeny. É um essencialismo que parece suprir qualquer tipo de necessidade de palavras que digam algo. E esse poder não é abandonado em grande parte do filme, que escolhe essa abordagem extremamente sensível, ainda sem abandonar o terror e a ficção científica. E não é que Fede Alvarez faça qualquer esforço pra esconder essa sensibilidade e os laços entre seus personagens, muito pelo contrário; põe todo esse simbolismo representado por um simples toque de mão. Ato tão simples que parece nada à primeira vista, mas a cada temor, a cada tensão, esse toque cada vez ganha um significado muito maior, que parece ter um peso grande em como os personagens se comportam durante o filme. Um significado de companheirismo, de irmandade, de amor, que não se limita só entre os dois irmãos.
Se os outros Alien pareciam seguir algum tipo de fórmula, Alien: Romulus consegue escapar desse paradigma, apesar de usar algumas referências às vezes (que é, inclusive, meu único problema com o filme. Algumas cenas de "referência" são muito vergonhosas e batidas: "Get away from her, you bitch", as cenas onde a personagem da Cailee Spaeny é quase uma emulação da Ripley...). Me arrisco a dizer que nenhum outro fime da franquia tenha tamanho apelo estético que contribua na narrativa. O charme das cenas em vermelho, lembram o bom Evil Dead (2013), também dirigido por Fede Alvarez. É legal comparar os dois lado a lado, pois, Fede parece ser alguém que compreende a temporalidade de sua obra e seu significado, e com isso, consegue trazer pra seu filme um olhar muito próprio, mesmo sem abandonar por completo as idéias do que o antecedeu. Aqui, por exemplo, trabalha muito mais um olhar estético, visceral e horrorífico do Xenomorfo, que é exposto a todo o momento, do que no Alien de Ridley Scott, que prefere o manter nas sombras, sempre à espreita. Enquanto esse é muito mais explosivo no horror, o outro é mais claustrofóbico. Mas pra mim, tá aí um dos grandes pontos do filme. Apesar de ter uma funcionalidade muito visível do monstro, ele não se limita só ao vermelho, por exemplo. Da escuridão ao tom amarelado, a composição visual funciona extremamente bem para ditar o tom da obra.
Tudo do mais visceral que tem no filme, provém justamente desse olhar com o monstro. Fede Alvarez não se limita em momento algum a sustos, e constrói um horror muito corporal e forte. Dinâmica é essa que é quase oposta nos momentos finais do filme, onde todo o terror que surge de um outro alien, tem toda relação com algum tipo de proximidade, quase que demoníaca. Toda essa visceralidade também tá ligado a como o filme constrói essas relações. Em uma das partes mais importantes do filme, onde Kay revela que tá grávida, a imediata reação é um plano detalhe de Rain com a mão em sua barriga. Esse laço emocional da cabo a sequência mais impactante do filme, que funciona muito pelo choque de toda delicadeza criada anteriormente, como já disse aqui.
É muito legal também que todo o gatilho pra embarcação espacial, buscando um novo planeta para morar, é uma tentativa de fuga de um sistema opressor, onde são basicamente escravos. Todas as menções a essa opressão, apesar de serem breves e pouco detalhadas, funcionam bem. Não é que Fede queira fazer essa a temática principal do seu filme, mas a maneira como ela é exposta e como os personagens reagem a essa busca de liberdade, até que indiretamente, compõe muito bem um cenário de um filme que não tem só uma camada superficial. É até meio que um contraponto pra quando Andy tem seu sistema resetado e passa a atender as vontades de uma empresa que o controla, ao invés de agir com um certo lado "humano". É até curioso que uma grande referência de como Fede Alvarez enxerga os dilemas de seu personagem, seja Blade Runner.
Em um resumo simples, é um filme que acerta MUITO na construção de seu universo, nas cenas de terror e ação e em toda escolha estética. Mas erra demais quando tenta referenciar seus antecessores, algo bem vergonhoso até, apesar de isso não pesar tanto, ao meu ver.

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